quinta-feira, abril 04, 2013

Interação humana digitalizada.

Estava sentado em frente a seu computador ouvindo música, com fones de ouvido a prova de som, sentado na sua cadeira de escritório, aquelas com rodinhas e estofado azul. Pela janela via alguns jovens fumando maconha nos bancos da praça. Entendia que aquele ato era quase como que uma aventura pros maconheiros, viajar sem ser pego pela polícia. Estava conectado pela vigésima hora consecutiva no seu perfil de rede social. Social? Vá entender. Encarava aquela atividade como algo normal, como que estar conectado com os seus “amigos” o tempo todo. Certa feita encontrou um amigo na rua, com o qual falava muito pela internet, e a única coisa que disseram foi “Ah, eu vi que você curtiu a foto que eu postei...” “Aham, foda!”. O silêncio brutal tomou conta após isso. A vasta rede de pessoas com as quais estava conectado mal encontrava no seu dia a dia. Perder o contato virtual era difícil. O contato virtual era algo como que encaixotar pessoas que um dia foram importantes, que fizeram-no rir, que abraçara... mas não é assim a vida? Desejou certa feita que fosse possível apertar um dos botões a fim de materializar determinada pessoa de sua rede social, em vão sabia que estava desejando utopias. Tal qual quando, cansado de esperar digitou em um buscador na internet “Onde ela está?”. Buscou também “o que ela está pensando?”. Os milhões de resultados nada correspodiam a sua realidade, porém existia algo doce dentro dele que dizia que em breve tal recurso estaria disponível. “O que passa na mente dela?” BAM, em 0.07 segundos, milhões de resultados, pesquisados diretamente no alvo desejado, extraídos da mente do objeto de seu desejo. Surgiriam páginas e páginas com o conteúdo do tipo “Preciso levar o cachorro na rua” ou “Que tédio, queria que alguém me ligasse” ou ainda “Estou com medo do que irá acontecer, afinal”. Sim, sem sombra de dúvidas existirá um dia que essas tais ferramentas estarão disponíveis. E aí nada mais o impedirá de ser feliz, pois terá acesso irrestrito a todos os segredos mundanos e do interior mais íntimo da alma humana. Terá ainda acesso a informações do tipo “devo eu levar tal situação adiante?”. O mundo virtual terá todas as respostas aos mistérios bobos e frívolos da humanidade e de seus intelectos limitados. Uma vez que tenha olhado uma foto compartilhada na sua página, os comentários mentais feitos acerca da mesma serão instantaneamente registrados e publicados. Tal fato causará um alvoroço e por fim quedará a hipocresia. Falar-se-á de tudo e de todos exatamente o que se pensa, através da manifestação de seus mais sinceros pensamentos. E talvez a mentira acabará, findando o gracejo, o flerte, a amortização, a empatia, sobrando o torpor. Uma máquina esganiçada começará a berrar quando quiserem apagar os registros de seu perfil, pois a coletânea de tais dados possibilitará traçar o seu perfil psicológico auxiliando melhor a venda de produtos direcionados aos seus individuais alvos. E sem perceber entraremos como loucos dentro dos carros a procurar um recanto, isolados do mundo, onde só o eu, o computador e as linhas tênues e invisíveis que nos conectam serão importantes. E o toque, e o velho, e o cheiro, e a camaradagem, e a mentira velada, e a flor sépia do amor, e as tórridas paixões, e os burburinhos quando uma mulher passa, e a fina elegância de um violão tocando Tom, e os livros impressos, e a morte, e os bebês e as crianças, e a sua compania, e o teatro da traição, serão coisas do passado. Enquanto o mundo gira num furacão rumo ao esquecimento.

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